hisorias para contar
Histórias continuam (Freepik)

Nós temos histórias pra contar. Um estoque inteiro delas, empilhadas em gavetas da memória, algumas organizadas por categoria – viagens, amores, desastres culinários –, outras soltas, flutuando sem data nem lógica, prontas pra aparecer quando menos se espera. E a melhor parte é saber que o estoque nunca acaba, quase como um repertório do Roberto Carlos.

É assim com minhas melhores amigas. Aquelas que apareceram em algum momento da vida e acabaram se perpetuando na minha existência. Outro dia, ao lado de uma dessas “antigas amigas jovens” – na alma, a juventude permanece, apesar da necessidade periódica de retoque no botox –, entre copos já meio vazios e risadas completamente cheias, começamos a relembrar algumas das peripécias compartilhadas.

Do dia em que saímos pra um bate-volta com o objetivo de registrar a chegada das baleias-francas no litoral, em pleno inverno, e só retornamos dias depois porque, no meio do caminho, apareceram outras notícias urgentes. Improvisamos algumas roupas básicas das grifes vendidas nos supermercados mais baratos do mundo e ficamos na torcida pra que o sinal do celular pegasse e o roaming – a taxa de deslocamento entre as cidades – não ficasse muito caro.

Da vez que, com minha sombrinha azul nada discreta, quase derrubei o helicóptero dos bombeiros que fazia um resgate de múltiplas vítimas. Levei uma bronca coletiva e tive que ficar pianinho. Nos autointitulávamos “para-raios de encrenca” – o que, no jornalismo, acaba até sendo algo positivo, sinal de que a gente estava sempre onde a notícia acontece.

Ou, ainda, do porre em que afogamos todas as mágoas, entre lágrimas, caipirinhas e muitas risadas, e voltamos pro hotel guiadas pela inspiração divina, já que juízo a gente não tinha muito naquela época. Evoluímos!

Fomos heroínas, vilãs e vítimas de nossas próprias escolhas. Fomos as que dançaram até o chão e as que pagaram por isso com dois dias de dor na lombar. As que acharam que sabiam tudo sobre o amor aos vinte e poucos e, aos quarenta, descobriram que nem os poetas sabem. As que já tomaram vinho barato fingindo que era bom e hoje se permitem escolher algo melhor, graças à maturidade e ao saldo da conta corrente.

Olhando pra trás, nos damos conta de que cada fase foi vivida no volume máximo, no ritmo certo pra idade que tínhamos. Fomos intensas quando dava, serenas quando precisou, inconsequentes na medida do que se pode chamar de aprendizado. E, se voltássemos no tempo, será que mudaríamos alguma coisa? Talvez não. Porque, do jeito que foi, rendeu boas histórias. Algumas pra gargalhar, outras pra suspirar, umas tantas que serviram de advertência pra não cometermos mesmos erros.

O melhor de tudo é pensar que essas histórias ainda continuam, com outros toques, novos personagens, cenários inusitados e, claro, muita cumplicidade. Se tem uma coisa que a vida ensinou é que, enquanto estivermos por aqui, tem capítulo novo sendo escrito. Comédia, drama, um pouco de ação – às vezes, uma tragicomédia involuntária. O estoque nunca acaba, e isso, por si só, já é motivo suficiente pra brindar. Que venha o próximo episódio. A gente promete viver direitinho, mas com margem pra boas anedotas no futuro.

*Danielle Blaskievicz é jornalista, empresária e acha que a coragem de viver e pagar mico é uma qualidade que deveria ser democratizada